Divagações sem fim esperando por respostas.
Uma busca sem rumo por certezas improváveis:
Dores, cores, amores, rancores.

domingo, 27 de dezembro de 2009

Playcenter


Na época foi triste.
Mas hoje em dia dá uma boa história de boteco:
Todo mundo já tinha ido ao Playcenter e eu ainda nem bebia Coca-cola! As excursões saíam todo final de semana da frente da Catedral e eu e o Rapha só babávamos.
Mas nunca perdemos a fé!
Se depois de uma greve de 6 meses na escola pública a gente conseguiu mudar para uma particular, um dia também chegaríamos ao Playcenter: a grande meta dos dois pirralhos.
Nas festas de aniversário meu pai saía de casa. Ele não gostava, não apoiava aquela "gastação" de dinheiro à toa. Mas a gente era tão feliz nelas... minha mãe nunca poupou esforços. Tinha aquela decoração especial. As letrinhas de "Feliz Aniversário" penduradas na parede.
Também torcia o nariz para nossas árvores de Natal. Se fechar os olhos lembro das musiquinhas. Se fechar as mãos com força, sinto a dor de cortá-las quebrando as bolas.
Viajávamos sempre. Desde pequenos. Tínhamos uma rotina de férias: todas no Satélite Esporte Clube, em Itanhaém, que claro, era colônia de férias do banco, algo muito justo. Barato e simples. Sem luxos.
E no caminho para Itanhaém- Tanhanhém, a gente brincava- sempre víamos o tal parque de diversões de longe. Bem de longe aquela roda-gigante nos chamava e o pai dizia pra mãe:
- Eu te disse que colocá-los na escola particular só os faria querer tudo que aqueles burguesinhos têm!
Ah, e vai me dizer se não é engraçado ir pra rua com doze anos e a cara pintada, sabendo certinho o que era " impeachment" ou fazer boca-de urna com 10 anos praquele barbudo lá, aquele que você conhece desde que saiu das fraldas.
Tudo bem. Depois de uma dessas férias em Itanhaém (comendo torta de chocolate na padaria Colibri no centro) meu pai cedeu aos pedidos de mamãe e nos levou a um parque: em São Bernardo, a Cidade da Criança. Cômico.
Super anos 70, tudo enferrujado. Mas a gente se divertiu.
Esse lance de socialismo tem o seu lado bonito. Toda utopia, os discursos, a coragem dos que realmente fizeram.
Não poder comprar roupa de marca e nem ir com as meninas pro Guarujá não importava muito quando eu fazia aula de inglês, natação e piano. Ganhava livros de fábulas japonesas de presente e fazia esculturas.
Hmm. Mas só depois de gente grande que eu percebi. Pra criançada doía.
Pra fazer intercâmbio outro parto: coisa de grã-fino. Agradeço pela mãe insistente que Deus me deu!
Faculdade só se fosse pública.Ai de mim se ousasse dizer: PUC- SP, Publicidade!
-Vai estudar, menina! Foi por isso que foi pra escola de rico, não foi?
Eu rio de tudo isso. Porque eu me orgulho da pessoa que me tornei.
Eu consegui quase tudo que queria.
Até fui ao Playcenter!
Lembro do momento mágico da compra de convites.
Um pra você, outro pra você e vamos! Felizes? Conseguiram o que queriam?
Saímos saltitantes em direção ao primeiro brinquedo. Devemos até ter dado as mãos enquanto corríamos, tamanha a emoção.
Aí vem uma voz grossa de um barbudo lá longe- todos os meus amigos morriam de medo dele por causa da barba:
- Onde vocês pensam que vão? Esse convite só dá direito à entrada, não aos brinquedos!
Acho que aquele foi meu primeiro grande momento de tristeza.
Na verdade, deve estar entre os top ten.
Foi mais triste que ganhar um tenis do Paraguay quando eu queria um New Balance ou não poder ir pra piscina com seus amigos nas férias, pois o Tenis Clube era coisa de bacana. Aquele momento doeu. Eu lembro dos olhinhos do Rapha cheios de água.
Mas eu não o culpo. Na verdade a culpa é do Fidel e daquele Che que fizeram meu pai nos deixar longe dos prazeres capitalistas.
E apesar dos pesares e de nunca ter de verdade andado em nenhum dos brinquedos do Playcenter, acho que foi por uma boa causa.
Se não fosse a CUT, o PT, o Lula, a Erundina, o Mercadante, a Marta, o povo do sindicato, o Che, o véio dos charutos, eu poderia ser uma patricinha loira e torcer para o São Paulo ao invés de ir em assembléia da greve da faculdade ou chorar quando o seu partido do coração é tão errado quanto os outros.

"Hay que endurecer, pero sin perder la ternura, jamás!"

Papito, é uma homenagem sincera. Mesmo que pudesse, não mudaria nada.
Teria ficado ainda mais ao seu lado. É por isso que sempre votamos juntos. Temos até uma brincadeira nossa: vamos com a mesma roupa: uma camiseta de estrelinha.

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