Divagações sem fim esperando por respostas.
Uma busca sem rumo por certezas improváveis:
Dores, cores, amores, rancores.

terça-feira, 27 de abril de 2010

meu cobertor

O dia bateu na janela do quarto e eu acordei sentindo frio. Meio zonza ainda de tantas horas em claro e tantas músicas dançadas e tanto sei lá o que, eu procurei minha coberta na cama e me deparei com você. Um sustinho bom de quando se acorda em casa alheia no sofá da sala e se pergunta "caramba, onde é que eu tô?" mas que logo passa quando vem lá no fundo uma vontade imensa de sorrir. Aquele sorriso bobo de criança quando apronta. Quando eu te achei do meu lado naquela manhã foi assim. E você estava ali, embrulhadinho no meu (só meu) cobertor. Como se toda manhã você esperasse para ser acordado com um beijo meu, cheguei pertinho e te abracei. Você não se mexeu, nem se encolheu, nem suspirou mais forte. Como se ali tivesse dormido os últimos tempos. Você tinha cheiro de festa e um cabelo macio onde eu me meti enquanto tentava tomar de você um pedaço de coberta. E foi só quando minha perna encostou na sua que você se virou e sem abrir os olhos me desejou bom dia. Saiu debaixo do cobertor e o passou sobre mim, beijou meu nariz, sorriu, beijou minha boca. Tudo ao mesmo tempo enquanto você se espreguiçava. E eu senti cócegas. Ficamos ali abraçados e mudos por vários momentos. O vento batia na janela. Acho que era agosto, um sábado gelado de agosto.
Enquanto você me abraçava eu pensei que você podia não saber quem eu era nem de onde vim, assim como eu não sabia que diabos você estava fazendo ali.E eu não sentia vontade nenhuma de perguntar. Mas numa manhã de frio e chuva tudo o que você mais quer é um abraço assim e um beijo assado e uma perna quentinha enrolando na sua. Loucuras à parte, o silêncio nos tornou quase namorados e você escolheu as palavras certas para celebrar aquela manhã. Palavras que não foram ditas mas escaparam, sem significado algum. Sem ter de onde vir nem pra onde ir. Palavra de gente grande quando dorme junto morrendo de vontade. Não havia espaço para consequência, certo, errado. Só existia gostoso. E que gostoso era a gente ali dormindo acordado, abraçado, encostado. O tempo parou enquanto você tirava minha blusa e eu mordia seu ombro. Enquanto você escolhia os beijos pra me dar e eu te permitia, um a um. Era quase meio-dia mas a chuva deixou nossa manhã com cara de madrugada. Nossa tarde com cara de manhã e depois disso o que eu senti foi só meu. Igual o cobertor.